Ensino de língua estrangeira e socialização do saber: abrindo caminhos para a cidadania

 

Cristiana Tramonte

(professora no Centro de Educação da

Universidade Federal de Santa Catarina- Brasil)

A questão da democratização do conhecimento tem feito parte dos debates sobre os rumos da Educação Brasileira no desafiador contexto do século XXI,  que exige redefinições de valores e comportamentos. A chamada Era da Informação delineia um quadro ao mesmo tempo promissor e sombrio, cuja preponderância de uma ou outra perspectiva dependerá de inúmeros fatores, mas certamente, é fundamental o papel do professor e da educação em geral neste contexto. O acesso ao conhecimento torna-se, crescentemente, uma das maiores exigências no campo da cidadania. No Brasil, esta necessidade se acirra, devido aos longos períodos de elitização educacional, exclusão e desigualdade social. 

O acesso às línguas estrangeiras tem um importante papel neste processo. Se levarmos em conta a extensão continental do país, e sua “solidão linguística”  na América Latina, veremos que o desafio de acessar a outras línguas estrangeiras, extrapola o âmbito da diversificação de instrumentos de comunicação, e diz respeito a uma possibilidade de uma perspectiva intercultural em seu sentido mais amplo. Ou seja, no monolingue contexto brasileiro, cujos fossos culturais são profundos, ter acesso a uma língua estrangeira consolidou-se historicamente como um privilégio de poucos[1]. Trata-se de reverter esta tendência, com iniciativas que visem a extensão do acesso de outras parcelas da população ao conhecimento de uma língua estrangeira, como uma estratégia de democratização do saber.

Histórico das desigualdades no ensino de línguas

Retomando momentos históricos significativos, Ballalai (1989) analisa a trajetória do ensino de línguas estrangeiras no Brasil, apontando que, a criação da escola pública, as tendências da chamada Escola Nova nas décadas de 50, 60 e 70 e a lei 5692/71[2], foram marcadas pela seletividade, psicologismo ou pragmatismo que impediram uma discussão mais séria sobre o papel da língua estrangeira no processo educacional brasileiro. Propõe, então, que o ensino de língua estrangeira possa ter um papel democratizante e equalizador das oportunidades sociais e não discriminador. Desta forma, o ensino de língua estrangeira seria um instrumento de educação, “baseado na reflexão e no espírito crítico", preocupado com as necessidades da educação no país, voltado para um "saber global" que auxilie na construção do aluno como sujeito de seu processo de aprendizagem.

Identidade linguística e democratização do acesso à LE

A democratização do acesso à língua estrangeira (LE) está intrinsecamente ligada ao tema da diversidade cultural que vem adquirindo crescente importância na atualidade. São notórios os conflitos étnicos em nível mundial e a criação de práticas racistas oriundas de preconceitos, estereótipos, intolerância cultural e incapacidade de compreender a dinâmica diferenciada das diversas culturas dos povos. Os conflitos mundiais tem recuperado o tema da diversidade cultural como uma prática prioritária inclusive em nível de práticas globais.  Neste sentido, o ensino de língua estrangeira deve apontar para uma perspectiva plurilingue, que considere as especificidades dos grupos com os quais atua.

Especificamente no sul do país, por exemplo, a colonização européia ocorreu intensamente chegando a constituir, no início do século, núcleos bastante consolidados com idioma e cultura enraizadas nos países de origem, apesar das imensas dificuldades enfrentadas no processo de luta pela manutenção da identidade linguística[3]. No caso de Santa Catarina, numericamente, destaca-se a colonização de alemães e italianos, além de outros, em menor  número, o que a caracteriza, segundo Trauer como uma sociedade plurilingue.  É necessário, portanto, considerar este traço cultural como importante na determinação das políticas de ensino delíngua estrangeira. No caso citado, por exemplo,  a “segunda língua” não é uma língua estrangeira, mas pode ser uma segunda língua materna, a língua do país de origem, cuja manutenção é fundamental para a cidadania destas populações[4].

Outro aspecto do desafio da inclusão da perspectiva intercultural é o chamado “monolinguismo estrangeiro” ou a oferta super-dimensionada ou exclusiva de uma determinada língua estrangeira na escola pública, o que é reflexo de uma orientação autoritária nos rumos da Educação brasileira. 

Trata-se de superar esta limitação e ampliar este universo de ofertas e possibilidades, oferecendo a oportunidade de acesso a outraslíngua estrangeira, de escolha dos próprios alunos, escola e comunidade.

Entretanto, a oferta ampliada de opções não resolve o problema da democratização do acesso à língua estrangeira. É necessário atentar para processos de construção do conhecimento neste campo. Segundo Bohn (1988) este "deve emergir da própria natureza da ação interativa dos acontecimentos da ação educativa" (p.294)[5].  Assim, a metodologia em língua estrangeira deve ser o resultado de um processo de “negociação” entre todos os envolvidos no processo educativo, os quais devem avaliar, escolher e questionar conjuntamente os procedimentos e materiais a serem utilizados no processo educativo. Segundo Magalhães & Dias (1988) os interesses dos discentes devem nortear a definição e organização de conteúdos, métodos, estratégias e procedimentos. Os materiais utilizados devem priorizar os objetivos educacionais e evitar os estereótipos culturais. Estas escolhas deverão ocorrer a partir das necessidades de aprendizagem de uma língua estrangeira. Dentre estas necessidades, Bohn destaca a definição dos contextos em que será necessário o uso da língua, as prioridades de habilidades das quais os alunos necessitarão,  a distribuição de horários, etc. Estas necessidades seriam o ponto de partida para o estabelecimento das metas e tipo de linguagem a serem enfocados.

Dentro do objetivo de expansão cultural e, portanto, de visão de mundo, a interdisciplinaridade é uma preocupação que deve permear todo o processo de aprendizagem. Célia (1988) analisa que a interdisciplinaridade proporcionaria o que denomina de “competência comunicativa”, incluindo-se aí a competência gramatical ou lingüística,  competência socio-linguística e a competência discursiva e estratégica.[6]

Extensão comunitária e processos participativos

Como exemplo concreto destas considerações,  algumas experiências vem sendo feitas no campo dos estágios supervisionados em Prática de Ensino de Língua Italiana na Universidade Federal de Santa Catarina. A perspectiva é transformar uma limitação em uma possibilidade. Como não há oferta de Italiano na grade curricular das escolas públicas da Grande Florianópolis, os estágios universitários são realizados na forma de cursos extra-curriculares oferecidos à comunidade. O objetivo é estender o campo de ofertas de língua estrangeira aos alunos da escola pública e comunidades ao redor destas escolas, possibilitando o acesso à Língua e Cultura Italianas à grupos populacionais que, na maioria das vezes, não possuiriam condições financeiras para frequentar um curso pago.

O conhecimento em língua estrangeira é hoje considerado um direito, um requisito para o exercício de uma cidadania plena, não apenas para os alunos em fase escolar, mas para a maioria da população. Entretanto, para que se viabilize como um instrumento eficaz nesta época em que se encurtam as distâncias físicas mas, em muitos casos, se aprofundam as distâncias sociais, é preciso pensar na construção de alternativas concretas que representem, na prática, iniciativas de democratização em todos os níveis, e, relevantemente, no campo do acesso ao conhecimento.

Através do projeto “Dialogando com o mundo: trocas interculturais e ensino de língua italiana” vem sendo desenvolvidas várias oficinas de Língua e Cultura Italianas, oferecidas pela Universidade em convênio com escolas públicas. Estas atividades são abertas à toda a comunidade e são frequentadas em sua maioria, por um público interessado no aprendizado da língua italiana, mas sem condições infra-estruturais de frequentar institutos de idiomas.

Nos cursos oferecidos, busca-se desenvolver metodologias que permitam a troca intercultural, fornecendo subsídios lingüísticos que facilitem a comunicação e o alargamento do universo cultural não só dos cursistas, mas dos próprios universitários-estagiários que atuam como professores. A intenção é oferecer uma alternativa cultural às comunidades envolvidas, além de integrar a Universidade à comunidade. Como parte de uma perspectiva democratizante e participativa, são realizadas reuniões preparatórias com as instituições educacionais envolvidas, além de eventos visando a socialização da experiência, envolvendo escolas e Universidade.

Até o presente momento o projeto foi desenvolvido junto às entidades: Escola Básica Hilda Theodoro, Colégio Estadual Professor Simão Hess, Escola Básica Dayse Werner Salles e Escola Básica América Dutra Machado, e Organização Não-governamental CEDEP.

A superação das desigualdades: algumas perspectivas

A superação da desigualdade de oportunidades de acesso ao conhecimento é um aspecto relevante quando falamos de uma realidade tão excludente quanto a brasileira. O alargamento do universo cultural é um direito de cidadania e  pode ser a justificativa por excelência da importância do ensino de línguas estrangeiras nas escolas públicas, composta em sua maior parte por indivíduos oriundos das classes populares, excluídos do acesso às riquezas produzidas pela sociedade e marginalizados em termos culturais.

O domínio de língua estrangeira auxilia o educando  em seu processo de auto-afirmação, recuperação ou afirmação da auto-estima, à superação do sentimento de impotência que tão freqüentemente acomete os indivíduos das classes populares nos processos educativos na realidade brasileira. Daí a importância de iniciativas que contemplem, entre seus objetivos, o alargamento deste campo de conhecimento a uma parcela maior da população. Os estágios de Prática de Ensino de Língua e Cultura Italianas mencionados privilegiam esta perspectiva.      

Entretanto, não é somente o universo populacional que deve ser alargado, mas também o campo das ofertas em língua estrangeira, garantindo inclusão da diversidade cultural. Trauer (1991) destaca que "um diálogo entre culturas, seus estereótipos, semelhanças e diferenças tem sido o preâmbulo para oportunizar o diálogo em situação comunicativa, motivando o aluno a expressar seu ponto de vista e aprender de forma ativa a língua" (p.25). Entretanto, torna-se negativa quando existe uma relação política, econômica e cultural com o país de origem da língua, que pressupõe uma relação de superioridade e uma conseqüente geração de complexo de inferioridade. O ensino da língua estrangeira com uma perspectiva democratizante deve contribuir para superar esta relação, construindo uma visão intercultural que horizontalize a valoração das mais diversas contribuições culturais mas negando a hierarquia entre as mesmas. 

Soares (1988) tratou das questões vinculadas à relação entre linguagem/ cultura/ ideologia e relações de poder vinculadas ao aspecto cultural. A superação do sentimento de inferioridade cultural ocorrerá exatamente por um trabalho de desmistificação junto ao educando[7], no sentido de esclarecer serem os fatores de ordem sócio-economica - e não cultural ou lingüístico - os que classificam as classes populares como cultural e linguisticamente inferiores, dando margem aos preconceitos de diversos tipos. Este sentimento de inferioridade é um dos obstáculos afetivos ao aprendizado da língua estrangeira. “A falácia da privação lingüística e cultural deve ser explicada...isso evitará, por um lado, interferências na identidade cultural do aluno e, por outro, coibirá uma visão colonialista...do Brasil.” (p.36).

 

A inversão de Babel

O ensino da língua estrangeira não é um “território neutro” do saber, mas pode representar um campo fértil de atuação crítica, propositiva e democratizante. Afinal, é a área por excelência que permitirá ao aluno das classes populares o contato com outras culturas, uma abertura importante para acessar ao conhecimento universal acumulado pela humanidade. Isto, é claro, se os educadores tiverem a consciência de inverter o “mito da torre de Babel”. Porto (1994) ao refletir sobre o ensino de língua estrangeira, lembra que, na tradição religiosa cristã e, que influenciou a formação do pensamento ocidental, o surgimento das línguas estrangeiras foi  a punição divina para combater o orgulho dos homens na torre de Babel. Ou seja, as línguas estrangeiras seriam um obstáculo às trocas culturais: o indivíduo estaria  isolado em profunda solidão lingüistica - o domínio exclusivo de seu  idioma materno e os seres humanos, enquanto seres coletivos estariam condenados a desentenderem-se.

         A tarefa dos professores de língua estrangeira aponta justamente para o contrário do que foi a maldição divina de Babel: falar, confrontar, conhecer e ensinar línguas estrangeiras pode ser, para a maioria da população, e, especialmente para os alunos que freqüentam a escola pública, a oportunidade de intercâmbio cultural, o alargamento das  várias possibilidades de expressão e comunicação, justamente a sua janela aberta para o mundo. Fazer a “globalização à nossa maneira” requer encarar seriamente os desafios metodológicos do ensino das línguas estrangeiras na atualidade, diante da transnacionalização de povos e fronteiras, os intercâmbios em nível global e os desafios da chamada “era da comunicação”.

 “Globalização à nossa maneira” significa também utilizar os instrumentos que estão ao nosso alcance numa perspectiva igualitária e de democratização do saber na educação brasileira e, neste caso, o ensino da língua estrangeira é um campo de conhecimento fundamental.

         Recuperar esta motivação junto às classes populares, ou reavivar-lhes o interesse cultural por outros povos é tarefa gigantesca a ser encarada seriamente pelos professores de língua estrangeira ao fazerem suas opções didático-metodológicas diante das contínuas mudanças de paradigmas pelos quais vem passando o conhecimento atualmente.

BIBLIOGRAFIA

·      BALLALAI, Roberto. A abordagem didática do ensino de línguas estrangeiras e os mecanismos de dependência e de reprodução da divisão de classes. Fórum Educacional, v.13, n.3, p.47-64, Rio de Janeiro, jun/ago.1989.

·      BIAGI, Maria Luisa Altieri. Didattica dell'Italiano. Italy: Edizioni Scolastiche Bruno Mondadori. Milanostampa di Farigliano. 1989.

·      BOHN, Hilário Inácio. Avaliação de Materiais. In: BOHN, H., VANDRESEN, P.(org).  Tópicos de Lingüística Aplicada: o ensino de línguas estrangeiras. Florianópolis: Ed. da UFSC, 1988, 333 p.

·      CARIONI, Lília. Aquisição de Segunda Língua: a Teoria de Krashen. In:  BOHN, H., VANDRESEN, P.(org).  Tópicos de Lingüística Aplicada: o ensino de línguas estrangeiras. Florianópolis: Ed. da UFSC, 1988, 333 p.

·      CARMAGNANI, Anna Maria. A contribuição do ensino de leitura em língua estrangeira na escola de 1º e 2º Graus. Perspectiva,  ano 4, n.8, p.52-58, Florianópolis, jan/jun.1987.

·      CÉLIA, Maria Helena Curcio. Objetivos dos cursos de Letras para a Formação de Professores de Línguas Estrangeiras no Brasil. In:  BOHN, H., VANDRESEN, P.(org).  Tópicos de Lingüística Aplicada: o ensino de línguas estrangeiras. Florianópolis: Ed. da UFSC, 1988, 333 p.

·      COOPERATIVA INSEGNANTI DI INIZIATIVA DEMOCRATICA - CIID- Corso di perfezionamento metodologico-didattico. Progetto per la formazione di insegnanti e operatori culturali delle associazioni di emigrati di origine emiliano romagnola e trentina in Cile. Provincia Autonoma di Trento, 1995.

·      FIORI, Neide Almeida. Rumos do nacionalismo brasileiro nos tempos da Segunda Guerra Mundial: o “nacional” e as “minorias” étnicas “inimigas”. Cadernos de Sociologia, v.4, n. especial, p.131-144, Porto Alegre, 1993.

·                          Homogeneidade cultural brasileira: estratégias governamentais sob o Estado Novo. Cadernos de Sociologia, n. especial, p.209-226, Porto Alegre, 1995

·                            O perfil ideológico da “Escola Estrangeira” em  Santa Catarina. Revista de Antropologia, n. 29, p. 113-133, São Paulo, 1986.

·      LEFFA, Vilson J. Metodologia do Ensino de  Línguas. In: BOHN, H., VANDRESEN, P.(org).  Tópicos de Lingüística Aplicada: o ensino de línguas estrangeiras. Florianópolis: Ed. da UFSC, 1988, 333 p.

·      MAGALHÃES, Helena M.G. de, DIAS, Reinildes. Prática de Ensino e aprendizagem em língua estrangeira. Belo Horizonte: Editora UFMG, 1988. 108 p.

·      PORTO, Maria Bernadette Thereza Velloso. O ensino de francês e de literaturas francófonas na UFF: a descoberta do outro. Fragmentos, vol.4, n.2, p.115-120. Florianópolis, 1994.

·      QUINTANILHA, Tânea Mara Rondon. Fluência Oral. In: BOHN, H., VANDRESEN, P.(org).  Tópicos de Línguística Aplicada: o ensino de línguas estrangeiras. Florianópolis: Ed. da UFSC, 1988, 333 p.

·      SOARES, Magda. Linguagem e Escola. Uma perspectiva social. São Paulo: Ática, 1992. 95 p.

·      TRAMONTE,  Cristiana. Globalização à nossa maneira. Boletim da ABVP, ano 9, n.17, p.2-4, São Paulo, jan/fev. 1993.

·      ___________. Novos desafios comunicativos. A informática na democratização do ensino de línguas estrangeiras. Vozes & Dialogo, n.1,ano2. FACOART/UNIVALI, 1998

·      TRATADO contra o Racismo. Tratados das ONGs. Aprovados no Fórum Internacional de Organizações Não Governamentais e Movimentos Sociais no âmbito do Fórum Global ECO-92. Rio de Janeiro: RJ, Instituto de Ecologia e Desenvolvimento, 1993. 264p.

·      TRAUER, Elisabeth. Alemão: uma língua estrangeira na escola catarinense? . Dissertação (Mestrado). Florianópolis: UFSC, 1994. 123 p.

·      VANDRESEN, Paulino. Lingüística contrastiva e ensino de línguas estrangeiras. In:  BOHN, H., VANDRESEN, P.(org).  Tópicos de Lingüística Aplicada: o ensino de línguas estrangeiras. Florianópolis: Ed. da UFSC, 1988, 333 p.



[1]Exceção seja feita ao caso do ensino da Língua Inglesa nas escolas públicas, e, mais recentemente, da Língua Espanhola, cuja problematização mereceria um estudo à parte.

Gramsci já havia chamado a atenção para a questão da língua como um problema que, na relação entre classes, coloca em cheque a questão da hegemonia cultural A este respeito declara: "Ogni volta que affiora, in un modo o nell'altro, la questione della lingua, significa che si sta imponendo una serie de altri problemi: la formazione e l 'allargamento della classe dirigente, la necessità di stabilire rapporti più intimi e sicuri tra i gruppi dirigenti e la massa popolare nazionale, cioè, di riorganizzare l'egemonia culturale" . BIAGI, 1989.

[2]Magalhães & Dias (1988) demonstram o caráter do ensino da Língua Estrangeira no IIº Grau na Lei 5692/71 como sendo essencialmente prático e voltado ao ensino profissionalizante. Embora alegue objetivos formativos, não regulamenta nenhuma iniciativa que possibilite este objetivo. Segundo Trauer (1994) a lei 5692/71 reinstalou "em seu bojo o  entendimento elitista. Também não encobria as concepções tecnocráticas ao priorizar os meios...em detrimento dos fins" (p.69). A autora aponta que, no  período da chamada “redemocratização” do Brasil, na década de 80,  serão tomadas algumas iniciativas no sentido de reintroduzir algumas línguas estrangeiras (além do inglês): alemão, italiano, etc.  no currículo escolar. O Projeto Piloto do Conselho Estadual de Educação de Santa Catarina elaborado em 1984/85 será um instrumento fundamental de reabilitação de línguas estrangeiras que haviam sido marginalizadas durante o período nacionalista getulista autoritário do Estado Novo no Brasil. Além da reintrodução das línguas estrangeiras, são consideradas também sua presença ativa enquanto segundas línguas maternas na escola catarinense.

[3] Fiori (1995) aponta como marco histórico do cerceamento à liberdade lingüística, o período da Primeira Guerra Mundial e o ano de 1917, quando a União determinou que fossem encerradas as atividades das escolas de Santa Catarina e Paraná que não ensinassem eficientemente o Português num contexto de “nacionalização do ensino no Sul do Brasil”. 

Alguns estudos sobre a relação entre dialetos e norma-padrão apontam para a dinamicidade da língua como reflexo da dinâmica cultural e aponta para a necessidade de  valorizar esta diversidade, ao invés de sufocá-la, sob pretensos nacionalismos. A este respeito ver Biagi, 1989. 

[4] Sobre este tema, e, especificamente a discussão sobre o caráter que adquiriram as línguas dos povos europeu que imigraram , vindo habitar em Santa Catarina ver o trabalho de Trauer, Elisabeth M. “Alemão: uma língua estrangeira na escola catarinense?” Dissertação de Mestrado, 1994. UFSC.

[5] Cfe. Allwright, 1984:8

[6]Não cabe aqui aprofundar estes diversos campos da chamada competência comunicativa. A autora baseia-se no trabalho realizado por CANALE & SWAIN, apud SAVIGNON, 1983-35-42 para justificar a amplitude do campo de alcance de uma visão interdisciplinar em língua estrangeira.

[7]O sociolinguista americano  William Labov desenvolveu pesquisas com crianças das classes oprimidas de Nova York, nas décadas de 60 e 70 e comprovou que é uma falácia a teoria da deficiência cultural e lingüistica, de Bernstein e outros . LABOV  demonstrou que as situações de pesquisa eram constrangedoras e ameaçadoras gerando imediatamente a retração destas crianças, o que dava margem à conclusões distorcidas sobre deficiência cultural e lingüística. Magalhães & Dias, 1988.


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